Gordofobia e Estigma do Peso causam obesidade

Existe uma onda antiga de pensamento que diz que a pessoa que está com sobrepeso ou obesidade tem que emagrecer pra ter saúde, e para emagrecer precisa só ter força de vontade e determinação, fazer dieta e academia. Isso porque é matemático: tem que comer menos e gastar mais, calorias que entram menos calorias que saem. O grande problema é que essa ladainha é simplista e gordofóbica, mas ainda é ensinada nas faculdades de nutrição e medicina.

Pensando nisso, em março desse ano, foi publicado um Artigo de Consenso pela Nature Medicine, assinado por mais de 100 associações ao redor do mundo, incluindo a brasileira Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). Esse artigo se baseou em uma análise de dados bibliográficos dentro de alguns critérios, realizado por 36 profissionais multidisciplinares de 9 países diferentes, buscando a resposta para algumas questões importantes sobre o estigma do peso e a gordofobia. Esse post vai ser totalmente baseado nas conclusões desse artigo, que você encontra na íntegra aqui.

Gordofobia na infância aumenta a obesidade

Uma grande quantidade de crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade sofrem provocações e bullying na escola e na família. Essas crianças estão significativamente mais propensas a sofrer isolamento social e serem vítimas de abusos físicos, verbais, em relacionamentos e online. Também estão mais suscetíveis a desenvolverem transtornos de saúde mental, especialmente depressão e ansiedade, além de diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares quando adultos.

O isolamento social e o bullying tiram da criança e do adolescente a vontade e a disposição de participar de esportes coletivos ou individuais, por medo de serem ridicularizados ou simplesmente rejeitados. Excluídos dos esportes, que muitas vezes acompanham o círculo social, essa criança ou adolescente se isola, e frequentemente acaba criando um comportamento ligado à alimentação em excesso. Isso foi comprovado quando se compara um grupo de crianças e adolescentes com sobrepeso ou obesidade que sofreram gordofobia de um grupo com o mesmo IMC, mas que não sofreram gordofobia. Esses últimos tendem a ter uma diminuição do IMC ao longo dos anos, conforme chega sua idade adulta. Ao contrário, aqueles que sofreram gordofobia irão apresentar com o passar dos anos risco aumentado de doenças relacionadas à saúde mental e aumento de IMC.

A gordofobia causa obesidade

A gordofobia, mais do que a obesidade em si, é muito prejudicial à saúde mental e está associada a sintomas de depressão, aumento dos níveis de ansiedade, baixa autoestima, isolamento social, estresse, uso de substâncias psicoativas, hábitos alimentares nocivos à saúde, comportamentos para controle de peso nocivos à saúde, como compulsão alimentar e comer emocionalmente.

Estudos experimentais também mostram, paradoxalmente, que expor indivíduos à gordofobia pode levar a um aumento de ingestão de comida, independente do seu IMC. Estudos controlados e randomizados mostram que experimentar a gordofobia está ligado a mais baixos níveis de atividade física, maior fuga de exercícios, consumo de dietas nocivas à saúde e aumento de comportamentos sedentários. Da mesma forma, foi constatado aumento na obesidade e ganho de peso ao longo do tempo, e aumento do risco de transicionar de sobrepeso para obesidade tanto em adolescentes quanto em adultos.

Os indivíduos com sobrepeso e obesidade que experimentam discriminação por causa do seu peso mostram níveis aumentados da proteína C reativa circulante, cortisol, risco cardíaco e metabólico no longo prazo e aumento na mortalidade quando comparados àqueles que não sofreram gordofobia.

Outro dia fui abordada em um grupo de discussão de terapeutas por um nutricionista que dizia que existia uma romantização da obesidade (disfarçado de aceitação de corpo), e que isso aumentava a obesidade. Na verdade essa concepção de muitos profissionais, que tiveram uma verdadeira lavagem cerebral na faculdade, está ERRADA. O preconceito e a marginalização resultantes da gordofobia que essas pessoas vivem, isso sim aumenta a obesidade.