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  • Foto do escritorCarol Avileis

Fome afetiva

Tenho realizado algumas palestras gratuitas sobre os diversos tipos de fome, para que as pessoas consigam compreender melhor essa tormenta que é saber a hora certa de comer, saber quando a fome é a fome certa.


Se você perdeu minha palestra sobre Fome Emocional, clique aqui e assista gratuitamente.


Hoje venho falar um pouco sobre a tal fome afetiva. Pra começar essa discussão, primeiro precisamos compreender o que é afeto.


Fome afetiva


Afeto então é sentir um sentimento terno de afeição por pessoa ou animal.

Afeição é uma ligação afetiva, um sentimento amoroso em relação a algo ou alguém.

A fome afetiva então seria justamente uma vontade de comer algo para preencher uma necessidade de afeto, uma necessidade de sentir o amor de alguém, de algum lugar, ou até de alguma memória.


O que a comida tem a ver com sentir esse afeto?


Quando nascemos, depois de limpar nossos pulmões chorando, dormir, fazer xixi e cocô, ou talvez até antes dos dois últimos, temos fome. Sentimos uma necessidade de nos alimentarmos, e essa sensação é inata, você nasce com ela, não precisa aprender a sentir essa necessidade de alimento chamada fome. Ela faz parte do repertório de comportamentos inatos porque assim garantimos nossa sobrevivência. Não tem nada mais angustiante que o choro de um bebê que está com fome! Ele nos move a tomar ação e alimentar essa criaturinha indefesa, mas que nasceu com uma habilidade incrível nas suas cordas vocais.


Entretanto, quando nossa mãe nos pegou no colo para que fossemos alimentados, nosso comportamento inato de ter fome sofreu um emparelhamento de estímulos, como chamamos em uma linha de estudo da psicologia chamada behaviorismo. O comer ficou associado à presença de uma criatura extremamente importante para nós: nossa mãe. Ao termos fome, choramos, e nossa mãe veio. Ela nos pegou no colo, conversou conosco, e nos trouxe para um contato próximo a ela, seja para uma amamentação, seja para nos oferecer a mamadeira. Dessa distância, junto ao seu peito, conseguíamos observar com nitidez seu rosto, e por algum tempo, ao nos alimentarmos, ficamos ouvindo seu coração, sentindo seu cheiro, o calor de sua pele e olhando seus olhos, isso quando não ficamos ouvindo-a falar palavras de afeto.


Naturalmente o comportamento de ter fome fica rapidamente associado a receber afeto.


Evolutivamente, isso faz todo sentido. A alimentação deveria sim ser uma forma de dividirmos momentos de carinho e afeto, já que os afazeres diários sempre foram bastante estafantes para todos os seres humanos, desde tempos primordiais. O momento da alimentação ficou sempre conectado a relacionamentos sociais afetivos e importantes, em todas as culturas, ao longo de todos os milênios.


Hoje nosso problema é diferente. Partilhar do alimento não é mais algo que as pessoas querem que seja prazeroso, onde dividem não só a comida, mas novidades e aprendizados sobre seu dia. Hoje em dia as pessoas não querem mais sentir afeto ou prazer para comer, querem sentir apenas as necessidades fisiológicas preenchidas. Se somente o que o corpo precisa para sobreviver for o quanto minha fome dita pra mim, talvez eu pare de comer besteiras, comer em excesso, ou pare de pensar em comida. Hoje eu quero só emagrecer e ficar o mais magra possível. Mas isso nunca foi a preocupação nem do homem, nem da mulher, ao longo da nossa história nesse planeta. Nunca nos preocupamos tanto com aspectos nutricionais e energéticos dos alimentos, e tão pouco com o afeto. E o corpo cobra a conta.


Falta de afeto


Isso quer dizer que a fome afetiva se manifesta quando você sente falta de afeto em geral, ou falta de afeto de forma específica. Pode ser que sua avó costumava fazer uma cuca de canela toda especial, e que você tenha vontade de comer essa receita para se lembrar dela e de momentos especiais da sua infância. Isso é fome afetiva. Pode ser que você sinta fome afetiva de um pastel na feira com caldo de cana, porque te lembra uma época em que a vida era mais simples. Ou que sinta vontade de comer milho com manteiga na praia, porque te lembra a sensação de relaxamento e férias. Pelos exemplos que eu dei, você já imagina que isso pode ir longe né? Comer com prazer, em busca de alimento para a alma, para a emoção e o corpo, não está errado e não há nenhum problema nisso, pelo contrário. É totalmente natural.


Qual o problema da fome afetiva? Na verdade, em condições saudáveis psicológicas, nenhum. Ela vai estar presente todos os dias, nas refeições habituais com a família, quando você comerá por prazer, não só da comida, mas da companhia e da interação social. Nesse momento, não só seu corpo é alimentado, mas seu psicológico e seu emocional também, e tudo funciona perfeitamente. De vez em quando, você sentirá vontade de se lembrar de alguma situação ou pessoa, e buscará determinado alimento (como a cuca de canela ou a espiga de milho do meu exemplo). Nenhuma dessas situações irá levar você a comer demais, perder o contato com suas necessidades biológicas, ou com seu corpo.


Por outro lado, o que acontece quando você tem uma carência constante de afeto? Aí o emparelhamento de estímulos será disparado de forma disfuncional. Ou seja, você irá constantemente buscar no alimento o afeto que falta na sua vida. Pode ser que sua família não se reúna pra comer, ou que o momento da refeição é tenso. Ou que cada um fique com seu celular ou assista TV e ninguém realmente partilhe afeto nesse momento. Pode ser que você tem uma carência de afeto por uma mãe que se foi, por um amor que não veio, ou por uma vida que já foi boa e agora não parece mais valer a pena. Aí sim, você está tentando suprir um afeto com comida de forma disfuncional. Agora sim você irá comer em excesso, ou mais doces, ou comer muita comida de paladar infantilizado, tudo em busca de um afeto que te falta. Esse não é o momento de se preocupar com o peso, entrar em uma dieta, contar calorias, tentar o (vão) autocontrole.


Esse é o momento de buscar ajuda, buscar terapia.


Realizar uma escrita terapêutica, explorando o afeto que te falta. Viver o luto que não foi vivido, quer de uma perda, quer de um divórcio, de um desemprego. Elaborar questões que não estão sendo elaboradas, para suprir o afeto que está, de forma automática, sendo buscado no alimento.


Perceba que o problema não é engordar, o problema não é a comida. É o afeto que está precisando ser suprido de forma disfuncional. Resolva o afeto e você resolverá seu problema com a comida e com a balança!


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